Imunizantes previnem tumores em câncer de colo de útero, fígado e bexiga. Vacinas terapêuticas combatem células cancerígenas, aumentando sobrevida dos pacientes.
As vacinas são uma das maiores conquistas da medicina moderna, pois ajudam a prevenir doenças infecciosas que antes causavam milhões de mortes em todo o mundo. Além disso, as vacinas têm um papel fundamental na proteção da saúde coletiva, promovendo a imunização em larga escala e reduzindo a disseminação de vírus e bactérias.
Além de prevenir doenças infecciosas, as vacinas também vêm sendo estudadas para auxiliar no combate ao câncer, através de técnicas de imunoterapia. Essa abordagem inovadora utiliza o sistema imunológico do próprio paciente para atacar as células malignas, proporcionando novas perspectivas de tratamento para diversos tipos de tumores. A combinação entre vacinas e imunoterapia pode ser uma grande aliada na busca por alternativas mais eficazes e menos invasivas no tratamento do câncer.
Democratizando a Prevenção: A Importância das Vacinas na Saúde Pública
E há perspectivas de que o arsenal de imunizantes contra tumores aumente.Abaixo, saiba mais sobre os tipos de câncer que podem ser prevenidos ou tratados com o apoio de vacinas.
Redução da Incidência: A Importância da Imunização Contra o HPV
A vacina mais conhecida para prevenção de câncer é a do HPV (sigla em inglês do papilomavírus humano), o vírus sexualmente transmissível mais comum do mundo e que está fortemente associado ao desenvolvimento de câncer de colo do útero – o principal tumor ginecológico feminino, sendo o terceiro mais frequente atualmente (atrás do tumor de mama e colorretal) e o quarto que mais matou mulheres no Brasil em 2021, segundo dados do Instituto Nacional de Câncer (Inca).
No SUS, a vacina é aplicada em duas doses.Existem cerca de 200 subtipos de HPV e a vacina tetravalente disponível na rede pública protege contra os tipos 6, 11, 16 e 18 – os dois primeiros causam as verrugas genitais, enquanto os dois últimos são responsáveis por cerca de 90% dos casos de câncer do colo do útero.
Há ainda um outro imunizante, nonavalente, que protege também contra os subtipos 31, 33, 45, 52 e 58 do HPV, e está disponível somente em clínicas particulares.’A vacina contra o HPV é essencial para evitar a transmissão do vírus.
A nossa produção de anticorpos é muito melhor nessa faixa etária, mas a indicação para essa idade é principalmente porque as crianças e os adolescentes ainda não foram expostos ao vírus.
Nós podemos adquirir imunidade depois do contato com o vírus, mas isso acontece tendo a infecção, que é o que pretendemos evitar’, explica a cirurgiã oncológica Jacqueline Menezes, membro da diretoria nacional da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO) e titular do Hospital Beneficência Portuguesa de São Paulo.
Avanços Promissores: Vacinação e Imunoterapia no Combate ao Câncer de Próstata
Além disso, estar com o calendário vacinal atualizado de maneira geral traz melhores desfechos de sobrevida aos pacientes com qualquer tipo de tumor.
Foto: terovesalainen/Adobe StockSegundo Jacqueline, é importante frisar que a infecção pelo HPV é extremamente comum e que cerca de 80% da população tem, teve ou terá contato com o vírus – mas a maioria das pessoas não desenvolverá lesões e, mesmo que desenvolva, poucas vão evoluir para câncer.
‘O problema é que no Brasil, e em outros países subdesenvolvidos, o câncer de colo do útero ainda é um importante problema de saúde pública e a vacina é uma ferramenta importante’, diz.
Desafios da Adesão: Estatísticas e Mitos Sobre a Vacinação Contra o HPV
Países desenvolvidos como a Austrália, por exemplo, que há muitos anos realiza uma grande campanha de vacinação em massa contra o HPV e tem um programa de rastreamento muito eficaz, praticamente erradicou o câncer de colo do útero – a meta do governo local é eliminar a doença até 2038.’Muitas pacientes me perguntam: quando vão inventar uma vacina contra o câncer?
Eu sempre respondo que já inventaram. A vacina do HPV, embora seja uma vacina para proteger contra o vírus, é a principal forma de proteger contra o câncer de colo de útero, afinal, quase todos os casos estão associados à infecção.
Atuo principalmente em tumores ginecológicos e posso afirmar que essa é a vacina que tem maior impacto na prevenção e, com ela, conseguiríamos erradicar essa doença, que ainda é detectada tardiamente’, afirma Jacqueline.Apesar dos benefícios, a vacinação contra o HPV ainda está bem abaixo do esperado.
Entre 2014 e 2023, 70,9% das meninas brasileiras receberam a primeira dose, enquanto apenas 54,3% delas foram imunizadas com a segunda dose.
No caso dos meninos, o índice é ainda pior: 45,3% receberam a primeira dose, e apenas 27,7% a segunda.Uma das explicações para a baixa adesão à vacinação é a crença equivocada de que a vacina seria uma forma de estimular ou incentivar o início da atividade sexual precocemente, enquanto, na verdade, o objetivo é garantir a proteção contra o vírus.CONTiNUA APÓS PUBLICIDADEO Inca estima cerca de 17 mil novos casos de câncer de colo de útero no Brasil por ano e 6.600 mortes.
‘O câncer de colo de útero não é o mais comum em países desenvolvidos, justamente porque eles têm programas eficazes de rastreamento e vacinação. É muito triste diagnosticarmos a doença em estágios mais avançados, sabendo que ela é prevenível.
E é a vacinação, juntamente com a recente implementação do teste molecular para pesquisa de HPV no SUS, que vão mudar a realidade do câncer de colo de útero no Brasil’, ressalta a médica.É importante ressaltar que a vacina do HPV não protege somente contra o câncer de colo do útero – ela atua também na prevenção de tumores no ânus, no pênis, na vagina, na vulva e orofaringe.
‘Todos esses tumores também estão associados à infecção pelo HPV, embora o foco principal, por seu grande impacto em saúde pública, seja o câncer de colo do útero’, destaca Jacqueline.Leia tambémCâncer prevenível por vacina é o terceiro mais incidente nas mulheres; saiba mais sobre eleCâncer de fígadoO hepatocarcinoma, ou câncer de fígado, é um tipo de câncer que na maioria das vezes se desenvolve a partir de uma cirrose hepática – uma doença grave associada sobretudo ao abuso do consumo de álcool ou à hepatite crônica.
Outro fator de risco importante para cirrose é o acúmulo de gordura no fígado (a esteatose hepática não alcoólica) que, se não tratada, também pode evoluir para câncer.
O que leva à hepatite crônica é a infecção pelos vírus da hepatite B ou C – e existe vacina disponível contra o tipo B.PublicidadeAcredita-se que cerca de 30% dos casos de hepatocarcinoma são causadas pelo vírus da hepatite B – e não existe vacina para hepatite C.
O imunizante contra a hepatite B está disponível na rede pública e é administrada em três doses: a primeira 12 horas após o nascimento, com reforços no período de um a dois meses e, novamente, dos seis aos 18 meses.Segundo a Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), adolescentes e adultos não vacinados anteriormente devem ser vacinados com três doses com intervalo de um mês entre primeira e a segunda; e de cinco meses da segunda para a terceira dose.
Pessoas com comprometimento do sistema imunológico necessitam de dose dobrada em quatro aplicações para melhorar a resposta ao estímulo produzido pela vacina.Em altaSaúdeLoading…Loading…Loading…Loading…Loading…Loading…O Inca estima o surgimento de 10.700 novos casos de câncer de fígado por ano e 10.600 mortes.’O hepatocarcinoma é tão típico no exame de imagem que é possível afirmar que é câncer sem necessariamente realizar uma biópsia.
E não é na análise do tumor que avaliamos se o câncer foi causado por uma infecção prévia pelo vírus B ou C, mas, sim, na sorologia (sangue) do paciente.
Ao diagnosticar o câncer, avaliamos a história do paciente: se é etilista, se é obeso, se teve hepatite B ou C, entre outros fatores’, explica Jacqueline.Uma ressalva importante feita pela médica é que existe um calendário geral de vacinação voltado à população adulta e que todas as vacinas devem estar atualizadas – elas são fundamentais para pacientes que estão em tratamento contra o câncer.’A gente pensa que vacina é coisa de criança, mas adulto também precisa se vacinar.
Estar com o calendário vacinal adequado traz melhores desfechos de sobrevida aos pacientes com qualquer tipo de câncer e é fundamental falar sobre isso com o oncologista’, afirma.
Vacina BCG: Uma Ferramenta no Combate ao Câncer de Bexiga
O câncer de bexiga é mais comum em pacientes tabagistas (fumar triplica o risco de desenvolvimento da doença) e é mais frequente em homens mais velhos. O Inca estima o surgimento de 11.370 novos casos anuais, além de quase 5 mil mortes.
O principal sintoma é o sangramento na urina – 90% dos casos apresentam esse sinal.Ao receber o diagnóstico do câncer superficial de bexiga, o primeiro passo é fazer a ressecção (como se fosse uma raspagem) do tumor, para eliminá-lo.
Em seguida, é feita a aplicação da vacina BCG: o protocolo padrão ouro indica seis doses de indução (uma por semana) e, depois, doses de manutenção a cada três a seis meses. O tratamento pode durar até três anos.’A bactéria da BCG é atenuada em laboratório para não existir a possibilidade de causar uma infecção no paciente, no caso, a tuberculose.
Essa bactéria produz um tipo de imunidade que não é específica contra o câncer. O que isso significa? Que ela não vai destruir as células do câncer de bexiga, mas vai ativar o sistema imunológico do paciente para que ele fique mais alerta e tenha mais chances de identificar células do câncer de bexiga que queiram progredir.
É o que chamamos de imunidade inespecífica’, explica o uro-oncologista Bruno Benigno, coordenador de uma das equipes de urologia do Hospital Alemão Oswaldo Cruz.Importante ressaltar que a vacina BCG não é aplicada isoladamente, ela é uma etapa do tratamento e atua num cenário adjuvante para diminuir o risco de recorrência do tumor – ela diminui em 47% o risco de recidiva quando comparada com o tratamento cirúrgico isolado.
‘Seu uso é clássico. A gente até esquece que a BCG é vacina de tuberculose. Para nós, a BCG é remédio.
Praticamente todos os protocolos de tratamento de câncer de bexiga não invasivo envolvem o uso’, acrescenta Jacqueline.
Avanços Promissores: Vacinação e Imunoterapia no Combate ao Câncer de Próstata
Além disso, estar com o calendário vacinal atualizado de maneira geral traz melhores desfechos de sobrevida aos pacientes com qualquer tipo de tumor.
Foto: terovesalainen/Adobe StockSegundo Jacqueline, é importante frisar que a infecção pelo HPV é extremamente comum e que cerca de 80% da população tem, teve ou terá contato com o vírus – mas a maioria das pessoas não desenvolverá lesões e, mesmo que desenvolva, poucas vão evoluir para câncer.
‘O problema é que no Brasil, e em outros países subdesenvolvidos, o câncer de colo do útero ainda é um importante problema de saúde pública e a vacina é uma ferramenta importante’, diz.
Fonte: @ Estadão
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